sexta-feira, 15 de maio de 2009

Histórias da casa amarela: as andorinhas

Coisas que eu via da janela da minha casa amarela...






Numa Primavera as andorinhas vieram fazer o ninho no beiral alto da casa amarela, por cima da janela do nosso quarto. Foi um alvoroço em nossa casa.


Elas vieram, no azul do céu claro, voltejando, iam, vinham, agitando as negras asas elegantes e a cauda aberta como dois bicos.
Nós íamos as três, pé ante pé, espreitar o que faziam. Era um ninho! Na parede lisa, mesmo junto às telhas, começou a aparecer uma forma redonda, esbranquiçada, que parecia feita de barro branco, com um buraco circular. Nunca tinha visto um ninho assim.
Corri a perguntar ao meu pai como é que elas faziam os ninhos e ele mostrou-me um livro com desenhos de pássaros e que explicava:
“Os ninhos das andorinhas são feitos de palhas e lama. A andorinha vai transportando estes materiais no bico..."

De vez em quando ouvíamos barulho e lá vinham as duas andorinhas, ora uma ora outra, trazer coisas no bico: as palhinhas e o tal barro que ia formando uma argamassa bem forte.
Eu ia para a janela da sala de estar, ao lado, encostava a cabeça na mão e ficava, sonhadora, a ver os arabescos que faziam volteando no ar e, depois, as cabecinhas negras a espreitar lá de dentro do ninho.
Pouco a pouco, tudo acalmou e elas só voltavam ao fim da tarde, e saíam de manhã cedo, mas a maior parte do tempo ficavam por ali, parecia-me que a cantarolar. Era um pipilar lindo, com sons agudos e doces.
Um dia uma das andorinhas, desorientada, ao regressar à tardinha, entrou pela janela do quarto. Andou às voltas, às voltas e foi cair na cozinha numa bacia de água.
- E se ela morre?, gritámos.
Fomos a correr chamar a minha mãe e ela veio e, com todo o jeito, tirou-a da água, pegou-lhe e alisou as penas molhadas que tremiam.
Recordo os olhinhos assustados a fechar e a abrir, e o medo que foi passando, numa forma de aceitação, expectativa, talvez confiança -quem sabe o que pensa uma andorinha?
A minha mãe embrulhou-a num cobertor cor de rosa das nossas bonecas e pô-la numa almofada, com uma tigelinha de água e miolos de pão esfarelado, ao lado.

Estivemos um bocadinho a vê-la e a minha mãe disse para a deixarmos sozinha porque estava muito assustada.

Saímos, silenciosas, deixando-a no quarto, perto do parapeito da janela. Não sei quanto tempo passou, creio que foram alguns momentos apenas.

Da janela da sala onde me tinha posto a espreitar, via-a de repente voar, voar longe, como se precisasse de se enxugar, ganhar forças.
Respirei fundo. Não a vi voltar nessa noite, mas na manhã seguinte havia de novo o pipilar e a agitação do costume à entrada do ninho.

2 comentários:

  1. Às vezes, parece tudo indecentemente simples e fácil, na Natureza. Porque será que os homens complicam tanto a existência??
    Beijinhos

    ResponderEliminar
  2. às vezes, parece tudo indecentemente fácil com a Natureza. Porque teremos nós, humanos, de complicar tudo??

    Beijos

    ResponderEliminar