terça-feira, 20 de março de 2012

Recordando Pierre Shoendoerffer e o filme Le Crabe-tambour (Fr.1977)


Pierre Schoendoerffer morreu...

Cenarista, realizador de cinema, jornalista, escritor, nasceu em 1928 em Chamalières (Puy-de-Dome) e morreu há dias em 14 de Março. 


Foram ontem as exéquias dele, em França.
Interno no Colégio Técnico de Annecy, durante a guerra, lê tudo o que encontra à mão e admira os aventureiros de todos os tempos.
Leu Joseph Conrad, Melville e adorou Joseph Kessel, cujo livro “La Fortune Carrée” o entusiasmou ao ponto de decidir da sua vida futura. Que o "encorajam", como ele diz, a seguir um caminho novo na vida... 


Herman Melville
Joseph Conrad
Josph Kessel




E vem o sonho de se tornar marinheiro, ele que nunca tinha visto o mar!
De Shoendoerffer vi há muito tempo um filme que não esquecerei: “Secção 317” (Prémio do Festival de Cannes de 1965), com dois grandes actores: Bruno Cremer e Jacques Perrin. A verdade é que escolheu sempre os mesmos actores para os seus filmes.
Filme de guerra, duro, cheio de dor, de desencanto e ao mesmo tempo - nem sei bem como - de esperança... Pela solidariedade? Talvez...



Schoendoeffer escreveu também um livro, “A asa da borboleta”. Lembram-se do “efeito borboleta”? "Ali, revela os movimentos íntimos, as convulsões, acções que “afectam” todo o mundo, (todo o ser humano?), mesmo que se passem do outro lado do planeta".
Ou, apenas, num barco, a meio do mar...
Encontrei mais este apontamento no L’Express online, numa notícia sobre a sua morte, em que se fala do livro:
“ (...) a ideia não é nova: o bater de asas de uma borboleta no mar da China pode provocar um tufão no Golfo do México.
Mas na “Asa da borboleta”, de Pierre Schoendoerffer, a ideia toma toda a sua a outra dimensão.
Romance do mar onde os homens se rasgam num cargo infame".
Lembro o filme de Hitchcock “Um barco e nove destinos" (Lifeboat, 1944)), baseado numa história de John Steinbeck, onde o drama acontece, idêntico.

Barco de sobreviventes, à deriva,  durante a Guerra, a luta pela vida, contra tudo e contra todos acirra-se.
Porque o homem na necessidade (ou mesmo sem a necessidade...), perde a dignidade, regressa aos instintos e... torna-se num lobo! Pior, porque o lobo é o lobo, os seus "motivos" são outros e tem sempre categoria!
Vi no domingo passado, na TV franco-alemã, ARTE, outro filme  “Le crabe-tambour”, realizado em 1977. Filme doloroso, por vezes difícil de seguir pelos constantes flash-backs.  
A história de dois militares, ex-combatentes - na Marinha de Guerra Francesa- , na Indochina e na Argélia, cruzam-se, nesses períodos de guerra, com uma estranha personagem. 
Na viagem, na acção presente, evocam o jovem militar que, separadamente, conheceram, e a quem chamavam o “crabe-tambour” (o caranguejo-tambor, do nome que o pai lhe dera em miúdo), sempre acompanhado por um gato preto que ele dizia ser a sua consciência – "pesada,  mas incorruptível".
Figura misteriosa que se tornou numa lenda para os que o conheceram: combatente na Indochina, prisioneiro de guerra, combatente na Argélia "do lado errado", que no fundo admiraram mas talvez não tenham sabido compreender sempre.
No filme perpassa a sombra da morte adiada,  a dificuldade de viver e de morrer: a “morte passa sempre, vai e volta e um dia para em cima de nós”. 
Como não pensar nos “talentos” perdidos? Como não saber perdoar? Como não prestar homenagem aos que a mereceram?
É o que pensa o Comandante - chamado pelos seus subordinados, afectivamente, "le vieux", ou "o rabugento". Nesses longos meses, passa em revista a sua vida e a dos que com ele viveram de perto, parte dela.


Nesta, que ele sabe vais ser a última viagem, o Comandante do barco-escolta "Jaurèguiberry" vai inconscientemente (ou conscientemente) à procura dessa personagem perdida que apenas sabe ser pescador solitário num bacalhoeiro, nos mares do Norte.
E mais: “não há mal e bem, há apenas um bem ...e outro bem...”, diz o Comandante, papel dado a Jean Rochefort (que ganhou em 1978 um César para o melhor actor por essa interpretação).
É, de facto, ele o extraordinário Comandante do  “Jaurèguiberry” - que cruza os mares do Norte, socorrendo os barcos pesqueiros isolados  nas águas geladas da Terra Nova, levando-lhes víveres, o correio, medicamentos. 
Claude Rich, Jacques Perrin, Bruno Cremer e  Jacques Dufilho são outros actores perfeitos...
Digno de Melville, Kessel  e Conrad, filme inesquecível!

Filmes de Pierre Schoendoerffer:

La passe du diable, 1958
Ramuntcho, 1958
Pescador da Islândia, 1959
Secção 317, 1965
Le  crabe-tambour,  1977
Dien Biên Phù, 1992
L’honneur d’un capitaine, 1998
Là-haut dans les nuages, 2003

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