segunda-feira, 16 de julho de 2012

Passam hoje 70 anos sobre o horror da «raffle du Vel' d'Hiv'»

Drancy, 1942, fotografia do jornal "Le Monde" de hoje

Passaram 70 anos sobre a “raffle du Vel’ d’hiv’”! A  "rusga" do Velódromo de Inverno, como foi conhecida depois.


Nos dias 16 e 17 de Julho de 1942, durante a ocupação nazi, 12.884 judeus (entre os quais 4.051 crianças) foram presos, em Paris,  na que foi chamada pelos alemães "Operação Vento da Primavera”.

Manhã de 16 de Julho, camiões da polícia que efectuaram a rusga (Le Monde)

Conhecida por “Raffle du Vel’ d’hiv’”, hoje e sempre.

O que foi? Bem, essa operação da Primavera (já no Verão, afinal...) foi como um "sequestro", foi a entrada da polícia em casas onde viviam judeus e foi “arrastá-los” para o Vélodrome d’hiver, um espaço amplo onde ficariam a aguardar o futuro.


mapa da Europa ocupada

Qual futuro? Os campos de concentração.

Assim, tudo bem organizado: os celibatários e as famílias com crianças com menos de 16 anos seguiram para o campo de concentração de Drancy. E os outros? Esses  são “arrumados” no Vel’d’Hiv – o tal Velódromo de Inverno.

Pode-se filmar o "Vél'd'Hiver"? cena do filme "Mr. Klein", de Josef Losey

Muito se falou já sobre o caso, mas nunca é de mais!

A polícia francesa “teria agido” sob as ordens dos alemães : foi essa a defesa das autoridades francesas.

Hoje sabe-se que não foi verdade...


Drancy foi um campo “de deportação” (temporariamente, de “concentração”) criado em 1941 pelo governo de Vichy do Maréchal Pétain, governo que “apoiou” a ocupação alemã.


Situado a poucos quilómetros de Paris, esteve sob o controlo da polícia francesa até à altura em que vieram os alemães para “acelerar as exterminações” (wikipedia). 


Construído para “abrigar” 700 pessoas, chegou a ter 7.000 prisioneiros. Igualmente estiveram prisioneiros homossexuais. As condições  de detenção eram brutais: as crianças eram separadas dos pais, a fome grassava. 

A maior parte dos que ali foram parar, ou seguiram para Auschwitz, ou morreram ali.

O campo foi libertado em Julho de 1944 pelas tropas aliadas. (wikipedia)

Thomas Bernard, desenho de Toulouse-Lautrec


Neste campo estiveram os escritores Max Jacob (que ali morreu em 1944), Thomas Bernard (pseudónimo de Paul Bernard), o coreógrafo René Blum, entre outras figuras mais conhecidas, todos eles de origem judaica.

Dos 120.000 prisioneiros que passaram por ali 65.000 eram judeus e, desses, morreram 63.000.

a actriz Kristin  Scott Thomas
Em 2011, saiu um filme do realizador francês Gilles Paquet Brenner, intitulado “A Chave de Sara" (Sarah’s key) sobre a "raffle du Vel’d’hiv".

Como contaram alguns sobreviventes, mais tarde, “é impossível que de 1940 a 1942 os nazis trabalhassem sozinhos na “eliminação” dos judeus. Como noutros países ocupados na altura, os nazis tiveram os seus cúmplices”.(1)


Em 1995, o então Presidente Jacques Chirac, na cerimónia comovente dos 50 anos desse momento dramático, realizada no Panteão de Paris, declarou:

A França nesse  dia cometeu o irreparável.”

Sabe-se que a polícia francesa agiu de forma independente e não, apenas, na dependência das ordens alemãs.

E isso é imperdoável!

Passaram 70 anos e a “raffle” continua a ser uma ferida e uma vergonha para a França...

1956, manifestação recordando 


Mas assinalemos, por outro lado, a quantidade de judeus que foram salvos e  as crianças que foram levadas para a província e escondidas em lugares seguros.

É que nos anima: a parte da humanidade que sempre se redime do mal que os outros fazem. Essa parte  é  a que “salva” a humanidade!..

De facto, inúmeros franceses  “desobedeceram” às ordens, e protegeram e esconderam e alimentaram judeus.

E salvaram-nos da morte!

 (1) O livro de Limore Yagi, que fala deste horror, saiu há cerca de um mês e intitula-se “La France, terre de réfuge et de désobeissance civile 39-44” (éditions du Cerf,  2012)

5 comentários:

  1. Arrepia pensar do que alguns são capazes mas é reconfortante saber que também há os que não se deixam corromper.
    Obrigada por nos lembrar disso.
    Um beijinho e uma boa semana

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  2. É um período tão-tão doloroso, tão humanamente revoltante!! Fui, com o meu pai, ver o lugar onde aconteceu o desembraque da normandia, o dia "D", e lembro-me de não conseguir impedir as lágrimas. Pensemos nos homens bons!
    Beijinhos e saudades

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  3. Querida Maria João,
    Um post pertinente. O "irreparável" é sempre uma palavra a abolir, não é?
    Atrocidades... desumanidade...silêncio cáustico.
    Beijinho e bem haja pela indignação.:)

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  4. É vital lembrar, é inevitável e necessário agradecer.

    nais tukê por tudo querida Falcão.

    http://cozinhadosvurdons.blogspot.com.br/2012/07/resposta-e-o-nosso-muito-obrigada.html

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  5. Não podemos esquecer a nossa História, temos que levá-la às costas com o bom e com o impresentável. Aqui há uns anos saiu esse filme delicioso "Monsieur Batignole", com Gérard Jugnot, não sei se viste. Uma história comovedora. Fazes bem em escrever sobre estas coisas, nunca, nunca é demais recordar tanto horror, mas sobretudo os gestos heróicos no meio do caos.
    Não li o livro, fujo destes temas muito.
    Un beijo

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