quinta-feira, 21 de agosto de 2014

"Alma, que fica por fazer desd 'hoje...."

Um poema de Sá de Miranda

Sandro Boticelli, Anjo


Soneto n.2

"Alma, que fica por fazer desd’ hoje
Na vida mais? Se a vã minha esperança
Que sempre sigo, que me sempre foge,
Já quanto a vista alcança a não alcança?

Fortuna que fará? Roube, despoje,
Prometa doutra parte em abastança:
Que tem com que m’alegre, ou com que anoje?
Tanto tempo há que dei mão à balança.

Chorei dias e noites, chorei anos,
E fui ouvido ao longe, pelo escuro
Gritando, acrescentar muito em meus danos.

Agora que farei? Por amor juro
De tornar a cantar fora d’engano,
E por muito do mal, posto em seguro.”

Rosso Fiorentino, anjo musicante

 Sá de Miranda, in Textos Clássicos, antologia, editorial Verbo, pág. 110


(Aceitei a sugestão de leitor amigo - que agradeço- e escolho nova ilustração)

3 comentários:

  1. É um texto triste...
    Gostei da pintura:)

    Um beijinho grande e um bom dia:)

    ResponderEliminar
  2. O grande Sá de Miranda! Já ele bem dizia aquilo de " Homem dum só parecer,/Dum só rosto e duma fé,/ Dantes quebrar que torcer,/ Outra coisa pode ser/ Mas de Corte homem não é"...
    Ai a Corte, sempre a Corte! E a Fortuna, tão caprichosa...

    ResponderEliminar
  3. É, para mim, um dos sonetos emblemáticos de Sá de Miranda. A versão que escolheu (opção de Rodrigues Lapa, nos "Clássicos Sá da Costa", também) segue a edição de 1614. Que a de 1595 propõe outra:
    "Alma que fica por fazerdes hoje..."
    Permita-me não gostar do quadro que associou ao magnífico soneto mirandino. E espero que me desculpe, democraticamente.

    ResponderEliminar