quinta-feira, 8 de setembro de 2016

AMIZADE ATÉ AO FIM, NUM LIVRO DE TANA FRENCH…


O novo livro de Tana French, publicado em 2013, "O Lugar Secreto”, fala, afinal e apenas, de amizade. 

Amizade  exclusiva, num colégio de raparigas, numa cidade da Irlanda. Num internato religioso, onde as adolescentes encontram as amigas que marcam a vida.
Tana French

Não muito longe, num internato para rapazes, idênticas condições sociais, idêntica riqueza, idênticos ‘gangs’, idênticas invejas, e ressentimentos.
Como é seu hábito, Tana French fala das pessoas e da vida comum. Desta vez, passa-se num internato para meninas ricas, de Dublin, jovens ricas ou menos ricas, de classes sociais diversas mas com dinheiro. De repente, nesse universo aparentemente tranquilo, tudo explode
Adolescentes que crescem juntos - e separados. Namoros, fitas, gritos excitados de algumas, quando se encontram com eles no Court, espécie de Centro Comercial. Conversas, gelados, sumos, sorrisos e veneno. Longe da cidade, longe de Dublin, longe de tudo.
Dublin à noite
A poucos metros, vivem, discutem, os estudantes. Quando se encontram no Court, namoriscam, de modo pouco respeitoso, as meninas do colégio St. Kilda
No dia de San Valentino encontram-se num baile, vigiados pelas freiras que andam a tomar conta. 
alunas dum colégio irlandês (internet) 
Reagem com um sentimento de superioridade em relação às jovens que, para eles, 'machisticamente' falando, são ‘para usar’.
Viver num colégio interno pode significar para os mais sensíveis ter momentos de adaptação difíceis.  
No fundo, são adolescentes, longe da família, das luzes da cidade, metidos num colégio para ‘endireitarem’, e para terem um futuro ‘seguro’, como o dos pais. Miúdos e miúdas imaturos e abandonados a si próprios e às ‘regras’ dos colégios. 

Muitos deles e delas são filhos de pais que não se entendem, ou separados. A indiferença, o egoísmo e o afastamento  em relação aos filhos predominam. A vida dos pais é dos pais, os filhos nalguns casos vieram por acréscimo, talvez indesejados. 
Há o poder e a fortuna a defender, o trabalho as relações públicas a manter. Filhos são maçadas ou mesmo 'empecilhos' à vida social querem continuar a ter livremente. 

A solução é, pois, o 'internato'! Vão a casa no fim de semana e nas férias? Ou vão só no fim do ano lectivo, quando são internas? Estão fora, não aborrecem!

Quem os olha? Quem os "vê"? Solidão em casa, solidão no colégio. Aceitam os adolescentes esse afastamento? Tornam-se 'invisíveis'...
Holly, uma das protagonistas, pensa no primeiro dia de colégio: "Ainda tenho tempo para mudar de ideias. Mudar ante que seja tarde. Fugir para casa e esconder a cabeça na almofada"
Mas fica. E criam-se amizades. Criam-se necessidades de companhia. Cria-se a raiva e escondem-se os ódios. O que é real, para elas, neste mundo novo do internato?

Como diz a directora, Miss McKenna, "as adolescentes perdem com muita facilidade o sentido das realidades". Para quê a internet, por exemplo? O melhor é fixarem-nas na realidade do colégio. 
Dois grupos se opõem: o de Joanne, a convencida e loira Joanne  Heffernan, de forte personalidade e fraca moralidade, seguida por duas ou três amigas Alyson, e Gemma, aparentemente dedicadas e submissas às suas opiniões. 
alunas dum colégio
Do outro lado, o grupo das quatro, personalidades muito diferentes,: Selena, Julie, Holly Mackey e Becca. Distingue-as a vontade de serem elas próprias acima de tudo. Vontade de serem respeitadas e não permitirem que os rapazes do colégio as ofendam com palavras ou gestos menos decentes. 
Certas atitudes chocantes de desprezo de uns e de outras podem levar a uma certa maldade incontrolada levam-nas a decidir não mais ligar ao grupo dos rapazes.
Recordo a grande Charlotte Brontë e o livro "Villette". "Numa escola de raparigas" era o subtítulo da edição da Portugália Editora, na Colecção Romances Universais onde li. 
Outros tempos mas os mesmos sentimentos, porque esses não mudam, nem o desejo de encontrar alguém que seja a nossa alma gémea, nem o sentimento de isolamento, nem o sofrimento quando nos pensamos "excluídos".
Um dia, Julie, Holly, Becca e Selena, perante atitude e o envio de sms ordinários por parte de alunos do outro colégio, decidem ignorá-los completamente, até ao momento de irem para a Universidade. 
Juram ser fiéis à amizade entre as quatro. Prometem confiar umas nas outras e contarem os problemas mútuos, as dúvidas: apoiarem-se, ajudarem-se sempre. 
Prometem-se eterna confiança, como os mosqueteiros : “uma por todas, todas por uma!” 
Querem desafios fortes, querem saber do que são capazes, experiências em liberdade, sem medo, inofensivas: ver o luar sozinhas, cantar e estarem encostadas a sentir o vento. 

Assim, Becca finge-se doente e, na enfermaria, rouba a chave da porta das traseiras à enfermeira. A partir desse momento, saltam o muro do colégio durante a noite enquanto as outras dormem. A fuga leva-as até à floresta. É uma bravata. Um desafio ao colégio, às freiras, à vigilância constante. 
E na clareira da floresta vêem o céu, o luar, a paisagem na noite e riem, riem, livres. E quando se cansam dessa efervescência da liberdade voltam à escola e metem-se na cama.

Mas - há sempre um ‘mas’!- um dia acontece uma desgraça! Um crime é perpetrado: Chris Marker, um dos estudantes, é encontrado morto na clareira da floresta, de madrugada. A clareira onde as raparigas se encontravam.
Vem a polícia, interrogatórios sem fim, e resolve-se da maneira mais simples para todos: é acusado do assassínio o guarda do estabelecimento, um estranho personagem, com problemas de droga.
O tempo passa, e tudo parece esquecido. Um ano depois, porém, o crime é trazido de volta à lembrança delas. 
É Holly quem encontra pregado na parede, no "canto dos segredos" -onde cada aluna podia 'desabafar' os seus segredos, fazer as suas queixas-  um bilhete, com a fotografia de Chris, onde estavam escritas as palavras: "Sei quem o matou". 
Nessa manhã, antes das aulas, sai da escola e vai falar com a Unidade dos Homicídios de Dublin porque receia que haja novo assassínio. Holly é a filha do Inspector Frank Mackey, não receia ir à Polícia.
É nesse momento que o detective Stephen Moran e a inspectora Antoinette Conway entram em cena. E encontram a recriação do mundo lá de fora, numa imaginação por vezes doentia, mentiras, fixações afectivas prejudiciais, fuga ao real.
Quando Miss McKenna se refere às suas adolescentes insistindo: "o nosso dever é ancorá-las firmemente no mundo real", a inspectora Conway olha-a ironicamente e pensa: "Isto é o mundo do real?"
Recomeça tudo do princípio: por que aconteceu? Quem pode ter sido?
Alguma não ‘respeitou’ o compromisso? Ou uma história de amor aconteceu, involuntariamente? 
Como a caixa de Pandora ao abrir-se, também aqui tudo entra na desordem. Tudo vai ser posto em questão. Muitas surpresas surgirão.

6 comentários:

  1. E agora fiquei curiosa! Estava a ler entusiasmada e até me esqueci que estava a ler um post e não o livro!

    Gosto deste tipo de livros.

    Um beijinho grande:)

    ResponderEliminar
  2. Interessei-me logo pela autora, que não conhecia. Agora pelo menos já sei tudo sobre ela graças ao google, claro. Achei piada como contas tu a história, e como a conta outro, em plano novela negra de suspense. Claro que foi a tua versão, mais psicológica, que me despertou a curiosidade.
    Falas de "o desejo de encontrar alguém que seja a nossa alma gémea": pessoalmente penso que as almas gémeas não existem, e que procurá-las desesperadamente é como procurar-nos a nós mesmos em vão.
    "Amizades até ao fim" sim que há. Umas poucas...
    Bom finde, um beijinho

    ResponderEliminar
  3. Vai ser muito interessante ler o livro, MJ
    Grata pela laboriosa e surpreendente apresentação.
    Um fim de semana agradabilíssimo.
    Beijinho sorridente.
    ~~~~~~~~~~~~

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Obrigada, Majo, pela curiosidade! Todos os livros trazem alguma coisa...excepto os que não trazem nada... Muitos famosos autores não (me)(nos) dão nada que preste! estes policiais levam-nos a outros mundos onde acontecem coisas, onde se vivem histórias dolorosas que não conhecíamos. Procure, acho que vai gostar. para mim o melhor é "Twins", mas todos têm muita coisa.
      Para ti, Isabel, digo o mesmo, procura encontrar , é impossível que ainda a não tenham traduzido. bom fim de semana a todas! Obrigada

      Eliminar
  4. tudo explode na claustrofobia. já se sabia, mas é bom lembrar sempre.

    (Charlotte Bronté, pois claro! lembro-me muito bem dela - ao que parece viva ainda. e de boa saúde)

    grato pela presença amiga

    ResponderEliminar